Teste ergométrico ou angiotomografia de coronárias para pacientes com suspeita de angina estável

14/07/2020, 14:20 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30

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  • Guilherme Loureiro Fialho - Médico Cardiologista do Centro Catarinense de Cardiologia e Hospital Univrsitário da UFSC. Diretor Financeiro da SBC/SC
  • Antônio Felipe Simão - Presidente da SBC biênio 2004-2005. Médico do Centro Catarinense de Cardiologia e Instituto de Cardiologia de Santa Catarina

Fundamentação: A avaliação da dor torácica (DT) permanece um desafio na prática clínica e a melhor estratégia de investigação pode variar conforme o contexto e o local. O teste ergométrico (TE) tem alta especificidade para diagnóstico de doença arterial coronariana (DAC) obstrutiva (90%) porém baixa sensibilidade (45 a 50%, dependendo do risco pré teste). Em 2019 a Sociedade Europeia de Cardiologia publicou um documento sugerindo investigação de DT com imagem, diferente da diretriz Norte-America de 2012 1,2.Em 2015, foi publicado no Lancet, o SCOT-HEART, estudo aberto, randomizado, multicêntrico, envolvendo 4146 indivíduos com suspeita de angina estável comparando uma estratégia de investigação habitual ou associada a angiotomografia computadorizada de coronárias (ATCC) 1. No estudo atual 4, publicado no JAMA, foi realizado uma análise post-hoc da coorte original comparando indivíduos que realizaram TE com aqueles que realizaram TE e ACTT quanto ao diagnóstico, terapia e prognóstico da angina pectoris e para avaliação da utilidade contemporânea adicional do TE na investigação de DT.

Metodologia: Análise pos-hoc da coorte original, envolvendo 3283 indivíduos com idade entre 18 e 75 anos que realizaram TE entre 2010 e 2014 para investigação de DT de origem anginosa. Um grupo avaliado com TE e outro com TE + ACTT, pareados 1:1 para sexo, idade, índice de massa corporal, fibrilação atrial, diabetes e histórico de DAC familiar. Foi utilizado, para o TE, o protocolo de Bruce até sintomas, isquemia, resposta pressórica alterada ou ter atingido a frequência cardíaca (FC) alvo (pelo menos 85% da FC máxima). Os TEs foram categorizados em normais, anormais ou inconclusivos, todavia sem menção das alterações e não adjudicados independentemente. DAC obstrutiva foi considerada se houvesse estenose ≥ 70% em coronárias epicárdicas ou ≥ 50% no tronco da coronária esquerda. Estenoses entre 10 e 70% forma consideradas não obstrutivas e ≤ 10% consideradas normais. Os médicos assistindo aos pacientes foram solicitados para reavaliar conduta e tratamento após 6 semanas da intervenção (TE ou TE + ACTT).

Mortalidade coronariana e IAM não fatal em 5 anos foi o desfecho primário.

Análise estatística habitual foi aplicada.

Principais Resultados: Foram incluídos 3283 (79% da coorte original) com idade média de 57 anos (50-64), 58% do sexo masculino. TE normais ocorreram em 67%, 16% anormais e 17% inconclusivos. 1651 pacientes foram randomizados pata ACTT sendo que 1417 (86%) fizeram o exame. Dentre aqueles com TE normal que fizeram ACTT, 15% tiveram DAC obstrutiva e 41% não obstrutiva. Dos 349 pacientes com DAC obstrutiva 39% tiveram TE normal. Dentre os pacientes que foram para cateterismo o TE anormal teve sensibilidade, especificidade, valor preditivo positivo e negativo de 39%, 91%, 58% e 82% para detectar DAC obstrutiva e 77%, 86%, 38% e 96% para DAC obstrutiva de significância prognóstica (considerada com lesão de tronco, triarterial ou biarterial envolvendo DA proximal), respectivamente. Com relação ao tratamento, o uso de antiplaquetários e estatinas, mesmo antes do exames diagnósticos, eram maiores naqueles que tiveram TE anormal. Taxas de início e descontinuação de remédios, além de número de cateterismos foi maior no grupo ACTT. TE anormal e inconclusivo, quando comparados ao TE normal, tiveram mais chance de evolução para revascularização miocárdica em 1 ano (HR 14,47 (10-21,41) e HR 3,23 (2,08-5,0), respectivamente). A presença de DAC obstrutiva e não obstrutiva na ACTT também se relacionou com revascularização em 1 ano (HR 1,7 (IC: 1,47-1,97) e HR 1,17 (IC: 1,04-1,33), respectivamente). Não houve diferença significativa dentre os grupos com TE anormal quanto a revascularização em 1 ano. Todavia, dentre aqueles com TE inconclusivo ou normal, o uso da ACTT foi associado com maior casos levados à revascularização (6% x 3%, p=0,02). Com relação ao desfecho composto de morte ou IAM não fatal em 5 anos na regressão multivariada, o TE anormal, quando comparado com TE inconclusivo ou normal, independente do grupo de alocação, foi 2,57 maior (IC 1,38-4,63, p<0,001). Todavia, em termo absolutos 65% dos eventos (60 de 92) ocorreram no grupo com TE normal ou inconclusivo. Em modelo separado, avaliando a ACTT, a presença de DAC obstrutiva e não obstrutiva aumentou o desfecho primário em 10,63 (IC: 2,32-48,7, p=0,002) e 5,32 vezes (IC:1,6-24,4, p= 0,03), respectivamente. O desfecho primário dentre os 2 grupos com TE anormal e normal não foram diferentes (p=0,47 e p=0,32, respectivamente) e dentre aqueles com TE inconclusivo a diferença foi de 2% para ACTT e 6% para TE+ACTT com p=0,05).

Conclusões: O TE em indivíduos do DT continua sendo útil para análise funcional de DAC obstrutiva, sendo que o TE anormal se relaciona com desfecho como morte coronariana, IAM não fatal e revascularização. Todavia, a ACTT permite reconhecimento de DAC em indivíduos com TE inconclusivo ou normal, relacionado a risco de IAM e melhorando as terapêuticas preventivas.

Impacto Clínico: O debate entre a estratificação funcional ou anatômica de DAC tem ganhado relevância nos últimos anos com o surgimento de novas tecnologias. O papel do TE em população contemporânea provou sua relevância e sua especificidade no diagnóstico de DAC. Todavia, sua sensibilidade é reduzida.

Cabe ressaltar que esta foi uma análise pos-hoc de estudo aberto com resultados do TE não avaliados por comitê independente. A adição de estratificação anatômica gera mais diagnóstico de DAC (obstrutiva ou não) o que gera melhora da terapêutica com provável melhora de desfecho duro como visto em outros trabalhos5. Uma lição importante a tirar do presente estudo é que o mesmo não comparou uma estratégia funcional versus anatômica, mas sim a soma das avaliações funcional contra funcional mais anatômica. A soma das estratégias para casos selecionados (como teste inconclusivo), como esperado, resultou em mais investigação invasiva, maior ajuste na terapêutica preventiva e menos eventos, principalmente não fatais.

Referências Bibliográficas:

  1. Knuuti J, Wijns W, Saraste A, et al; ESC Scientific Document Group. 2019 ESC guidelines for the diagnosis and management of chronic coronary syndromes. Eur Heart J. 2020;41(3):407-477. doi:10.1093/eurheartj/ehz425.
  2. Fihn SD, Gardin JM, Abrams J, et al; American College of Cardiology Foundation. 2012 ACCF/AHA/ACP/AATS/PCNA/SCAI/STS guideline for the diagnosis and management of patients with stable ischemic heart disease: executive summary: a report of the American College of Cardiology Foundation/American Heart Association Task Force On Practice Guidelines, and the American College of Physicians, American Association for Thoracic Surgery, Preventive Cardiovascular Nurses Association, Society for Cardiovascular Angiography and Interventions, and Society of Thoracic Surgeons. Circulation. 2012;126(25):3097- 3137. doi:10.1161/CIR.0b013e3182776f83
  3. SCOT-HEART investigators. CT coronary angiography in patients with suspected angina due to coronary heart disease (SCOT-HEART): an open-label, parallel-group, multicentre trial [published correction appears in Lancet. 2015 Jun 13;385(9985):2354]. Lancet. 2015;385(9985):2383-2391. doi:10.1016/S0140-6736(15)60291-4.
  4. Singh T, Bing R, Dweck MR, et al. Exercise Electrocardiography and Computed Tomography Coronary Angiography for Patients With Suspected Stable Angina Pectoris: A Post Hoc Analysis of the Randomized SCOT-HEART Trial [published online ahead of print, 2020 Jun 3]. JAMA Cardiol. 2020;e201567. doi:10.1001/jamacardio.2020.1567.
  5. Newby DE, Adamson PD, Berry C, Boon NA, Dweck MR, Flather M, Forbes J, Hunter A, Lewis S, MacLean S, Mills NL, Norrie J, Roditi G, Shah ASV, Timmis AD, van Beek EJR, Williams MC. Coronary CT angiography and 5-year risk of myocardial infarction. N Engl J Med 2018;379:924–933.
  6. #DOENÇA_CORONÁRIA_ESTÁVEL

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