Taxa de hemoglobina glicada pode ser mais relevante do que a escolha dos enxertos na cirurgia - CRVM
11/04/2023, 17:51 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30
Compartilhar
O resultado de um recente estudo abre portas para uma importante investigação
Estudos prévios com grandes bancos de dados internacionais mostram que pacientes submetidos à cirurgia de revascularização do miocárdio com dois ou mais enxertos arteriais têm melhor sobrevida a longo prazo (10 anos ou mais).
Mesmo com essa evidência, cirurgias utilizando múltiplos enxertos ainda são minoria. Por que isso ocorre?
O estudo Resultados Imediatos após Múltiplos Enxertos Arteriais em Cirurgia de Revascularização Miocárdica no Estado de São Paulo: Estudo de Coorte, publicado na última edição da ABC Cardiol, periódico da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC), busca responder essa e outras perguntas.
O objetivo foi entender qual a tendência do uso de dois ou mais enxertos arteriais no Brasil, mais precisamente no estado de São Paulo, e se essa utilização traria mais complicações a curto prazo (até 30 dias) ou no período de internação do paciente.
Para isso, foram utilizados dados de um banco do estado de São Paulo, registrado e estruturado com o apoio da Harvard American School. O período que abrange essa subanálise é de junho de 2017 a junho de 2019.
Omar Meija, professor de Cirurgia Cardiovascular na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e principal autor do estudo, traz detalhes sobre a análise: “o banco de dados contava com dados de 3112 pacientes que passaram por cirurgia de revascularização do miocárdio, isolada e primária. Desses, somente 531 utilizaram dois ou mais enxertos arteriais, enquanto a maioria, mais de 2500, usaram somente um enxerto”.
Como não houve uma randomização do grupo, foram necessárias algumas adaptações.
“Fizemos um ajuste para selecionar 531 pacientes do maior grupo com o mesmo risco de mortalidade do grupo que utilizou dois ou mais enxertos. Para isso, utilizamos o score de risco mais usado no mundo, o STS”, explica Omar.
Algumas análises que foram feitas foram incidência de reintervenção, infecção de ferida profunda, AVC, lesão renal aguda após cirurgia, intubação prolongada (por mais de 24 horas), tempo de internação curta e longa (mais de 14 dias), além da própria mortalidade.
Os resultados mostram que houve um aumento de pacientes operados com a técnica multiarterial. O aumento no uso de dupla mamária foi de 50% entre 2017 e 2019, enquanto o uso de enxerto radial aumentou 100% no mesmo período, seguindo uma tendência mundial.
No grupo de pacientes que utilizaram dois ou mais enxertos, a ocorrência de infecção na ferida torácica foi mais alta, independente da utilização de dupla mamária ou artéria radial.
Esse grupo também apresentou mais casos de derrame pleural, pneumonia e intubação. Omar explica que muitos tiveram pneumonia durante o pré-operatório, o que pode ter influenciado nos resultados.
Por outro lado, a favor da técnica multiarterial, ele diz: “o paciente ficou menos tempo internado, não houve corte na perna, o que possibilitou que ele se reestabelecesse mais rápido da cirurgia, o tempo de internação diminuiu”.
Uma subanálise é tida pelo professor como a informação mais valiosa do estudo: “Acreditamos que os pacientes infectaram mais, não pelo uso de dupla mamária, mas porque a hemoglobina glicada estava estava alta. Não necessariamente acima de 8, que é o tolerável para a cirurgia, mas ainda assim em níveis altos, entre 6,5 e 8”.
Em pacientes eletivos, hoje, o valor para hemoglobina glicada ideal pré-cirurgia é abaixo de 8. Omar acredita na importância de realizar um grande estudo comparando pacientes multiarteriais e uniarteriais com a hemoglobina glicada abaixo de 6,4, valor ideal encontrado na análise.
“O corte da hemoglobina glicada em 6,4% foi o que encontramos menor incidência de infecção nos pacientes, e esse é o grande achado do estudo”.