TAVI para pacientes idosos com estenose aórtica reumática
20/04/2021, 10:03 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30
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- Gustavo Martins P. Alves - Cardiologista Intervencionista pelo InCor-HC USP/Hospital Samer Resende-Rj
Fundamentação: O implante de válvula aórtica transcateter (TAVI) já é uma terapia muito bem estabelecida para o tratamento da estenose aórtica (EA) degenerativa calcífica em pacientes idosos. Os grandes ensaios clínicos randomizados que pavimentaram a evidência científica atual do TAVI excluíam a EA de etiologia reumática. Assim sendo, existe dúvidas se o TAVI apresentaria o mesmo bom desempenho quando indicado para pacientes com valvopatia aórtica reumática. Com este intuito, um estudo foi realizado e recém publicado no Journal of the American College of Cardiology comparando desfechos clínicos de pacientes com EA reumática que foram submetidos ao TAVI à pacientes submetidos a troca valvar aórtica cirúrgica (TVAC) também por EA reumática e à pacientes submetidos ao TAVI por EA calcífica(1).
Metodologia: Estudo retrospectivo onde os autores avaliaram pacientes do programa de saúde norte-americano Medcare submetidos a TAVI ou TVAC entre outubro de 2015 e dezembro de 2017. Paciente com EA reumática foram identificados utilizando a Classificação Internacional de Doenças, versão 10. Análise por escore de propensão foi realizada a fim de ajustar para confundidores entre os grupos. O desfecho primário foi mortalidade por todas as causas. Múltiplos desfechos secundários foram avaliados.
Principais Resultados: A coorte final do estudo incluiu 1.159 pacientes com EA reumática (605 foram submetidos ao TAVI com idade média de 79,4 anos e 554 à TAVC com idade média de 73,4 anos) e 88.554 pacientes submetidos ao TAVI por EA não-reumática (idade média de 81,2 anos). Paciente do grupo da TAVC eram mais jovens, apresentavam menos comorbidades e menor escores de fragilidade. Após uma mediana de 19 meses não houve diferença em morte por todas as causas entres os grupos TAVI e TAVC (11,2 vs. 7,0 por 100 pessoas/ano, respectivamente; hazard ratio ajustado de 1,53; p = 0,2). Comparado ao TAVI nos casos não reumáticos, TAVI na EA reumática foi associado a mortalidade similar (15,2 vs. 17,7 por 100 pessoas/ano; hazard ratio ajustado de 0,87; p = 0,2) após uma mediana de seguimento de 17 meses. Nenhum dos pacientes de TAVI reumáticos necessitou ser submetido a novo procedimento aórtico durante o seguimento.
Conclusão: Comparada a troca valvar cirúrgica, o TAVI pode representar uma opção viável e durável para pacientes com EA reumática.
Impacto Clínico: Este estudo publicado na última edição do JACC traz uma informação relevante para a prática clínica do cardiologista, em especial para o cardiologista que atua em países cuja prevalência da doença valvar reumática ainda é considerável. Apesar da apresentação clínica indistinguível, existem diferenças anátomo-patológicas entre a EA calcífica e a EA reumática que podem prejudicar o implante adequado de uma válvula de TAVI. Como por exemplo, a EA reumática se apresenta com um maior predomínio de componente degenerativo fibrótico, com a calcificação do aparato valvar ocorrendo numa fase mais tarde da doença. Isto poderia comprometer a ancoragem da válvula transcateter, implicando em potencias complicações relacionadas aos procedimentos e piores desfechos clínicos. No entanto, mesmo não havendo estudos específicos, na prática, o TAVI já vinha sendo empregado de forma off-label em casos de EA reumática de alto risco cirúrgico com resultados clínicos aparentemente semelhantes aos observados nos não-reumáticos. Os resultados deste estudo corroboram a percepção que já se tinha da prática clínica sendo, portanto, mais uma opção no arsenal terapêutico do cardiologista. Vale ressaltar, contudo, que estes achados são derivados de um estudo observacional e retrospectivo, sujeito a vieses inerentes a natureza de tais. Portanto, ainda devemos reservar o TAVI na EA reumática como para pacientes cujo risco cirúrgico for muito alto ou proibitivo.
Referência Bibliográfica:
- Amgad M, Marwan S, Y. DM, Amar K, Venu M, A. HP, et al. Transcatheter Versus Surgical Aortic Valve Replacement in Patients With Rheumatic Aortic Stenosis. J Am Coll Cardiol. 2021 Apr 13;77(14):1703–13.
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