Recomendações para Ressuscitação Cardiopulmonar de pacientes com diagnóstico ou suspeita de COVID-19
Recomendações para Ressuscitação Cardiopulmonar de pacientes com diagnóstico ou suspeita de COVID-19

24/03/2020, 09:31 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30

Compartilhar

Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE), Associação de Medicina Intensiva Brasileira (AMIB), Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC)

A ressuscitação cardiopulmonar (RCP) é um procedimento máximo de emergência e passível de ocorrência em pacientes portadores de COVID-19. Demanda, portanto, atenção especial, particularmente quanto ao risco maior de aerossóis durante as manobras de compressão torácica e ventilação, oferecendo risco relevante de contaminação para a equipe assistente.

Considerando este cenário em que as evidências sólidas estão pouco documentadas ou acessíveis, a Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE) recomenda as seguintes práticas:

  • Os processos da tomada de decisão para as diretrizes de ressuscitação cardiopulmonar (RCP) devem continuar sendo individualizados nos Departamentos de Emergência e Unidades de Terapia Intensiva (UTI), e a RCP deve ser sempre realizada a menos que as diretrizes indiquem o contrário.
  • As decisões de “não ressuscitação cardiopulmonar” (NRCP) devem estar adequadamente documentadas e comunicadas à equipe. Os cuidados paliativos e de terminalidade devem seguir a política local e institucional.
  • Todos os pacientes suspeitos ou portadores de COVID-19 que estejam sob maior risco de deterioração aguda ou parada cardiorrespiratória devem ser adequadamente sinalizados aos Times de Resposta Rápida (TRR) ou equipes que irão proceder o atendimento.
  • Todas as medidas apropriadas para garantir a adequada proteção individual (conforme diretiva de atendimento a casos de COVID-19) durante a RCP devem ser provisionados antes que a PCR ocorra. A pronta disponibilidade de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) promoverá menor retardo no início das compressões torácicas.
  • Ainda que possa ocorrer atraso no início das compressões torácicas, a segurança da equipe é prioritária, e o uso de EPIs adequados é indispensável pela equipe que atende a PCR. Nenhum procedimento deve ser realizado sem a instalação prévia do EPI completo, incluindo compressões torácica e procedimentos em via aérea.
  • Os EPIs para procedimentos com geração de aerossol devem ser usados por todos os membros da equipe de ressuscitação, e devem ser adequadamente instalados antes da entrada no local de atendimento à PCR.
  • Conjuntos de EPI devem estar disponíveis no carrinho de ressuscitação ou parada, para pronto uso.
  • O uso de escores de gravidade e sistemas de rastreamento e disparo de códigos amarelos permitem a detecção precoce de pacientes graves e pode otimizar o atendimento de eventuais PCRs.
  • A avaliação de potencial dificuldade para laringoscopia / intubação deve ser realizada quando da admissão do paciente no hospital e/ou na UTI. Escores como MACOCHA* ou mnemônicos como LEMON** podem auxiliar na determinação de via aérea difícil e prévio acionamento de suporte.
  • O reconhecimento da PCR segue a conduta preconizada pelo ILCOR/AHA com avaliação de pulso central e ausência de respiração efetiva.
  • A RCP deve ser iniciada por compressões torácicas e monitorização do ritmo da parada cardíaca (chocáveis ou não chocáveis) o mais rápido possível para estabelecimento do algoritmo adequado.
  • A desfibrilação em ritmos chocáveis não deve ser adiada para acesso às vias aéreas ou outros procedimentos.
  • Considerando ser a hipóxia uma das principais causas de PCR nestes pacientes, o acesso invasivo da via aérea deve ser priorizado.
  • A ventilação boca a boca e uso de máscara de bolso são proscritos.
  • Deve-se evitar a ventilação com bolsa valva máscara (BVM) ou bolsa-tubo endotraqueal, pelo elevado risco de aerolização e contaminação da equipe, além da efetividade não ser superior à da ventilação mecânica, em acordo com as evidências disponíveis atuais.
  • No caso de absoluta necessidade de ventilação com BVM, a técnica de selamento da máscara deve sempre envolver dois profissionais e deve-se utilizar uma cânula orofaríngea (Guedel). Além disso, preconiza-se a instalação de filtros (HEPA) entre a máscara e a bolsa.
  • A garantia de uma via aérea avançada para isolamento e menor probabilidade de aerolização e contaminação da equipe de atendimento, bem como melhor padrão de ventilação/oxigenação, deve ser priorizada para os pacientes ainda sem um dispositivo invasivo durante a PCR. Não esquecer da instalação de filtros (HEPA) no circuito ventilatório após o tubo traqueal e na via do circuito expiratório.
  • A intubação através de videolaringoscopia deve ser a primeira escolha para o acesso rápido e seguro às vias aéreas, de acordo com os procedimentos de intubação segura previamente referenciados pela ABRAMEDE e AMIB.
  • A intubação traqueal com videolaringoscópio deve ser prioridade desde a primeira tentativa, realizada sempre pelo operador mais experiente. No caso de falha, a ajuda/apoio de um segundo médico deve imediatamente ser acionada e, caso opte-se por uma segunda tentativa, a videolaringoscopia deve ser considerada novamente.
  • A falência ou impossibilidade de intubação demanda a necessidade de dispositivos extra glóticos (tubo laríngeo ou máscara laríngea), que permitem a ventilação mecânica em circuito fechado até que haja a adequada possibilidade de acesso definitivo à via aérea (intubação traqueal ou cricotireoidostomia).
  • Quando a PCR ocorrer em pacientes sob ventilação mecânica, deve-se manter o paciente conectado ao ventilador em circuito de ventilação fechado, com fração inspirada de oxigênio a 100%, modo assíncrono, frequência respiratória em torno de 10 a 12 por minuto. Alguns ventiladores apresentam a função “RCP/PCR”, que ajusta automaticamente os limites de alarme e aciona os parâmetros alinhados acima.
  • Identifique e trate quaisquer causas reversíveis antes de considerar interromper a RCP, com especial consideração para hipóxia, acidemia e trombose coronária, causas citadas como frequentes nas publicações atuais sobre COVID-19.
  • Restrinja o número de funcionários no local do atendimento (se for um quarto individual comum).
  • Antecipe a solicitação de leito em unidade terapia intensiva e isolamento respiratório em caso de retorno à circulação espontânea (RCE).
  • Descarte ou limpe todo o equipamento usado durante a RCP seguindo as recomendações do fabricante e as diretrizes locais da instituição.
  • Quaisquer superfícies de trabalho usadas para posicionar equipamentos de vias aéreas / ressuscitação, também precisarão ser limpas de acordo com as diretrizes locais. Especificamente, verifique se o equipamento usado nas intervenções das vias aéreas (por exemplo, laringoscópio, máscaras faciais) não foi deixado no travesseiro do paciente - procure deixá-los sobre uma bandeja; cuide para que a cânula de aspiração também não fique sobre o travesseiro do paciente - descarte a extremidade contaminada dentro de uma luva descartável.
  • Remova o EPI com segurança para evitar autocontaminação.
  • A higiene das mãos tem um papel importante na diminuição da transmissão do COVID-19. Lave bem as mãos com água e sabão e utilize o álcool gel.
  • Realize o debriefing ao final de cada procedimento. Isso estimula melhorias e crescimento da equipe.
  • Simulações para treinar correta colocação e retirada do EPI e atendimento a PCR devem ser realizadas o mais precocemente possível por todas as equipes envolvidas no atendimento a pacientes com suspeita ou confirmação de COVID-19.

*MACOCHA: Mallampati III ou IV, síndrome da Apnéia (obg>tong>rong>strutiva), limitação da coluna Cervical, abertura Oral <3 cm, Coma, Hipoxemia e operador não Anestesiologista intubou previamente.

**LEMON: Look (olhar externo: micrognatia, deformidrong>ades de face), Evaluate (3:3:2), Mallampatti, Obstrução/obesidade, Neck (pescoço sem mobilidade).

Autores: Hélio Penna Guimarães (1), Sérgio Timerman (2), Thiago Correa (3), Roseny dos Reis Rodrigues (4), Ana Paula Freitas (5), Álvaro Rea Neto (6), Ludhmila Abrahão Hajjar (7), Fernando Bacal (8), Marcelo Queiroga (9)

  1. Emergencista e Intensivista. Presidente da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE). Médico do Departamento de Pacientes Graves (DPG) do Hospital Albert Einstein. Médico da UTI do Instituto de Infectologia Emílio Ribas. Doutor em Ciências pela USP.
  2. Emergencista, Cardiologista e Intensivista. Diretor do Centro de Treinamento de Emergências Cardiovasculares e Ressuscitação e do Time de Resposta Rápida do Instituto do Coração (InCor) do HC da FMUSP. Coordenador do Centro de Treinamento da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Doutor em Ciências pela USP.
  3. Intensivista. Coordenador do CTI Departamento de Pacientes Graves (DPG) do Hospital Albert Einstein. Doutor em Ciências pela USP.
  4. Anestesiologista e Intensivista. Médico do Departamento de Pacientes Graves (DPG) do Hospital Albert Einstein. Doutor em Medicina pela USP.
  5. Emergencista. Primeira Secretária da Associação Brasileira de Medicina de Emergência (ABRAMEDE). Médica do Departamento de Emergência dos Hospitais Mãe de Deus e de Pronto Socorro de Porto Alegre. Coordenadora da Residência de Medicina de Emergência do Hospital de Pronto Socorro de Porto Alegre. Mestre em Ciências Médicas pela UFRGS.
  6. Intensivista. Presidente do Comitê de Medicina Intensiva Cardiológica da AMIB. Professor de Medicina da UFPR. Diretor do Centro de Estudos e Pesquisas em Terapia Intensiva (Cepeti).
  7. Professora Associada de Cardiologia da FAMUSP desde 2013. Atualmente é Diretora de Ciência, Tecnologia e Inovação da SBC (2020-2021) e atua nas áreas de cardio-oncologia e de terapia intensiva. É Vice-Coordenadora da PG em Cardiologia da FAMUSP e Coordenadora de Cardio-Oncologia do ICESP e do Incor.
  8. Diretor do Núcleo de Transplantes do InCor-HC-FMUSP e Diretor Científico da Sociedade Brasileira de Cardiologia (2020/2021).
  9. Presidente da Sociedade Brasileira de Cardiologia (2020-2021) e Diretor do Departamento de Cardiologia Intervencionista – Hospital Alberto Urquiza Wanderley.

Referências:

  • De Jong A et al. Early identification of patients at risk for difficult intubation in the intensive care unit. Am J Respir Crit Care Med 2013 Apr 15; 187:832.
  • Advanced Airway Type and Its Association with Chest Compression Interruptions During Out-of-Hospital Cardiac Arrest Resuscitation Attempts. span>Prehosp Emerg Care 2017 Sep-Oct;21(5):628-635.
  • Bernoche C, Timerman S, Polastri TF, Giannetti NS, Siqueira AWS, Piscopo A et al. Atualização da Diretriz de Ressuscitação Cardiopulmonar e Cuidados de Emergência da Sociedade Brasileira de Cardiologia – 2019. Arq Bras Cardiol. 2019; 113(3):449-663
  • Diretrizes RCP 2019 American Heart Association. Disponível em : https://eccguidelines.heart.org/wp-content/uploads/2019/11/2019-Focused-Updates_Highlights_PTBR.pdf
  • Resuscitation Council UK. Guidance for the resuscitation od COVID-19 patients in Hospital. Disponivel em : http://resus.org.uk
  • World Health Organization. Infection prevention and control during health care when novel coronavirus (nCoV) infection is suspected. Interim Guidance. January 2020.
  • World Health Organization. Clinical management of severe acute respiratory infection when novel coronavirus (2019-nCoV) infection is suspected. January 2020.
  • Cheung JC, et al. Staff safety during emergency airway management for COVID-19 in Hong Kong. Lancet. FEb. 2020.
  • Tran K, Cimon K, Seern M, Pessoa-Silva CL, Conl J. Aerosol generating procedures and risk of transmission of acute respiratory infections to healthcare workers: a systematic review. PLoS One 2012; 7:e35797.
  • Simonds AK, et al. Evaluation of droplet dispersion during non-invasive ventilation, oxygen therapy, nebuliser treatment and chest physiotherapy in clinical practice: implications for management of pandemic influenza and other airborne infections. Health Technol Assess. 2010.
  • Pan L, et al. How to face the novel coronavirus infection during 2019-2020 epidemic: the experience of Sichuan Provincial People’s Hospital. Intensive Care Med. Feb. 2020.
  • Hill C, et al. Cricothyrotomy technique using gum elastic bougie is faster than standard technique: a study of emergency medicine residentes and medical students in an animal lab. Acad Emerg Med. 2010.
  • Higgs A, et al. Guidelines for the management of tracheal intubation in critically ill adults. British Journal fo Anaesthesia. 2017.
  • YangX, Yu Y, et al. Clinical course and outcomes of critically ill patients with SARS-CoV-2 pnemonia in Wuhan, China: a single-centered, retrospective, observational sudy. Lancet Respiratory Medicine. Feb 2020.
  • Xie et al. Critical care crisis and some recommendations during the COVID-19 epidemic in China. Intensive Care Med. 2020.
  • Wax RS, et al. Practical recommendations for critical care and anesthesiology teams caring for novel coronavirus (2019-nCoV) patients. Can J Anesth/J Ca Anesth.
  • Peng PWH, et al. Outbreak of a new coronavirus: what anaesthetists should know. British Journal of Anaesthesia. 2020.
  • Brewster DJ, et al. Consensus Airway Society principles of airway management and tracheal intubation of COVID-19 adult patients group. Safe Airway Society, Australian and New Zealand. Australian and New Zealand Intensive Care Society. March 2020.
  • Clique aqui para ver o pdf

Comentários

Logotipo da SBC

Sede - São Paulo

Alameda Santos, 705

11º andar - Cerqueira César

São Paulo - CEP: 01419-001

E-mail: sbc@cardiol.br

Sede - Rio de Janeiro

Av. Marechal Câmara, 160

andar - Sala: 330 - Centro

Rio de Janeiro - CEP: 20020-907

E-mail: sbc@cardiol.br

Telefone: (21) 3478-2700

Redes sociais

Link para LinkedInnLink para FacebookLink para TwitterLink para YouTubeLink para Instagram

Baixe o app Cardiol Mobile

Apple Store BadgeGoogle Play Badge
Certificação 9001 da SBC

Desenvolvido por:

Produzido por Docta