Conhecimento qualificado é fundamental no combate à Covid-19
30/04/2020, 11:42 • Atualizado em 21/12/2023, 17:30
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Para coordenador de Ações de Prospecção da Fiocruz, Carlos Grabois Gadelha, campanha “De Coração, contra o Coronavírus”, da SBC, contribui para o enfrentamento da pandemia
O planeta enfrenta uma das mais graves e desafiadoras crises sanitárias: a pandemia da Covid-19. Mais do que nunca, a saúde como valor e direito universal precisa ser afirmada, ao mesmo tempo que se fortalece a importância de políticas públicas baseadas nas melhores evidências científicas. Esta tem sido a missão da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz): produzir, disseminar e compartilhar conhecimento e tecnologias voltadas ao fortalecimento e à consolidação do sistema de saúde que contribuem para a promoção da saúde e da qualidade de vida.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) designou a Fiocruz como referência em Covid-19 nas Américas. “Isso significa que os esforços de pesquisa, inovação e vigilância da Fundação são reconhecidos como um dos pilares nacionais para a geração de conhecimentos e informações relevantes para o entendimento global e nacional sobre a situação dos vírus respiratórios”, informa o coordenador de Ações de Prospecção da instituição, Carlos Grabois Gadelha.
A Fiocruz tem atuado na área de diagnósticos da Covid-19, com a produção nacional de kits de diagnóstico e a análise laboratorial de amostras. “Os ensaios clínicos realizados para definição de terapêuticas eletivas no âmbito de diversos estudos e na coordenação nacional da pesquisa clínica Solidarity – iniciativa liderada mundialmente pela OMS para avaliação de opções de tratamento – traz a Fiocruz à sua missão histórica no desafio permanente de colocar a ciência e a inovação a serviço da sociedade”, ressalta Gadelha.
Por estar na linha de frente do combate à Covid-19, a Fiocruz avaliou como muito positiva a iniciativa da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) em promover a campanha “De Coração, contra o Coronavírus”, que visa levar informação e conhecimento aos profissionais de saúde, aos pacientes, sobretudo aqueles com comorbidades associadas a doenças cardiovasculares e à população em geral sobre as medidas preventivas e de combate à infecção por SARS-CoV-2. “Essa atitude é fundamental em um momento em que precisamos de conhecimento qualificado para ajudar nossa sociedade e os gestores públicos e do setor privado. Com a campanha, a SBC contribui também como agente de disseminação de protocolos e práticas a serem seguidas por pacientes e profissionais da saúde para enfrentar a pandemia da forma mais consciente e segura possível, com base em conhecimentos científicos e tecnológicos sólidos”, destaca Gadelha.
Para ele, a racionalidade, o isolamento social responsável e a busca de soluções para a retomada dependem da articulação com a ciência em saúde na qual o Brasil tem tanta excelência, sendo a área de cardiologia uma das mais importantes do país. “A promoção, a prevenção, o diagnóstico e o tratamento adequado, incluindo os quadros de comorbidade, são essenciais para não sobrecarregar o sistema de saúde com casos evitáveis e para não perder profissionais de saúde da linha de frente ao combate da Covid-19. Essa iniciativa da SBC, essencialmente, reafirma a contribuição da cardiologia brasileira para a nação em um momento tão crítico de pandemia em que vivemos”, ressalta.
Gadelha também vê semelhanças na atuação da Fiocruz e da SBC: duas instituições que têm um grande papel a cumprir para que a ciência seja o fundamento das práticas sociais e das políticas públicas. Isso é possível, em sua visão, levando informação e conhecimento como forma de coibir a disseminação de notícias falsas. “O advento e a popularização das redes sociais ampliaram o acesso à informação, mas o senso crítico sobre a confiabilidade das fontes ainda não está garantido. Devemos trabalhar na conscientização de todos e sermos fontes confiáveis para disseminar informações verídicas à sociedade.”
Indústria da saúde
Parte da crise vivida no Brasil atualmente no combate à epidemia do novo coronavírus se agrava devido à dependência do país em importar equipamentos, produtos farmacêuticos e insumos. “Só na saúde, saímos de um déficit comercial de US$ 3 bilhões, há 20 anos, para um déficit de US$15 bilhões. Em meio à crise do coronavírus, o país se vê dependente de importações até de máscaras e luvas, além de ventiladores e fármacos, cuja dependência é da ordem de 80%”, afirma Gadelha.
Para ele, não é razoável tamanha dependência em um país que construiu uma ciência e tecnologia tão importantes e com tantos talentos. É uma questão que o Brasil precisa discutir. “A dependência tecnológica em larga escala traz um problema de soberania. Nós temos ciência, base industrial e tecnológica bem como o maior sistema de saúde do mundo, que é o SUS”, ressalta o especialista, que afirma ser necessária uma visão estratégica, na qual as respostas de curto prazo estejam conectadas ao objetivo de reduzir a vulnerabilidade do SUS no longo prazo, para dar horizonte aos investimentos produtivos e tecnológicos tanto do setor público quanto do privado.
Sobre a ausência de políticas públicas de incentivo à indústria da saúde nacional, Gadelha explica que a falta estratégia de desenvolvimento culmina em outra questão: é possível ter um sistema de saúde universal com tamanha dependência produtiva e tecnológica?
A dependência do Brasil dos produtos de saúde importados não é um problema recente, mas, quando tudo vai bem, muitos acreditam que é mais barato comprar de fora, não devendo incentivar a produção nacional. “No curto prazo, pode parecer mais interessante produzir soja e minério de ferro do que medicamentos, equipamentos e instrumentos médicos. O problema da visão imediatista é que a partir dela se perpetua a dependência. A crise sanitária atual confirma essa visão de modo estarrecedor”, lamenta Gadelha.
A capacidade de resposta à crise em saúde pública atual em grande medida está fundamentada na rede de pesquisa e laboratórios públicos e privados do país. Mas, em meio à pandemia, o orçamento da ciência e tecnologia foi contingenciado em 87%, o que, para o coordenador da Fiocruz, é preocupante e reflete a necessidade de uma visão estratégica. “O contexto sanitário atual e futuro depende do conhecimento científico, tecnológico e da inovação. Temos que criar condições de produzir e de estar à frente de setores mais intensivos em conhecimento. A ciência e tecnologia devem estar a serviço de nosso sistema universal para nunca mais sermos pegos de surpresa por uma situação global tão desafiadora para cuidarmos de nossa gente, em uma perspectiva de solidariedade nacional e global”, conclui Carlos Gadelha.